Quinta-feira, 21 de novembro de 2024 Login
Os medos mais comuns são o medo da morte ou de ficar gravemente doente, de contaminar os outros ou das repercussões econômicas envolvidas
Foto: Divulgação
Artigos recentes vêm discutindo mais um impacto causado pela pandemia da Covid-19: a chamada “coronophobia” (tradução livre para o português como “coronofobia”). Este termo vem sendo usado para designar o medo, a preocupação e a ansiedade de contrair o Covid-19, referindo-se também ao impacto psicológico e aos prejuízos funcionais provocados nas pessoas por esta doença.
Os medos mais comuns são o medo da morte ou de ficar gravemente doente, de contaminar os outros ou das repercussões econômicas envolvidas. A adoção de uma série de novos hábitos e medidas pode também contribuir para a intensificação dessa situação. Os quadros associados são ansiedade (incluindo pânico e ansiedade generalizada), depressão, angústia, comportamentos obsessivos, acumulação, paranoia, reações de evitação, sensação de desesperança, ideação suicida e atos consumados de suicídio.
Enquanto algumas dessas reações podem, a princípio, ser confundidas como comportamentos normais e esperados diante das circunstâncias correspondentes à pandemia, outras respostas são claramente prejudiciais e maladaptativas. Nestes casos as reações podem se cronificar ao invés de se abrandarem com o passar do tempo. Como consequência é possível observar o impacto sobre a procura por tratamentos psiquiátricos e o aumento da prescrição de psicofármacos. Através de 3 artigos recentemente publicados vamos entender um pouco mais sobre este assunto.
Compreendendo a situação
O termo “fobia” designa uma forma de transtorno ansioso no qual se vive as consequências de um medo intenso, persistente e, às vezes, desproporcional sobre um objeto, ser ou situação. Geralmente também é acompanhado por um comportamento de evitação de estímulos que possam desencadear ou piorar a ansiedade e o temor.
No caso da Covid-19, os artigos referem-se a uma preocupação excessiva com os sintomas fisiológicos, a necessidade de buscar medidas de reasseguramento, estresse relacionado à perdas sociais e ocupacionais e evitação (que envolve situações e lugares públicos, por exemplo). Os gatilhos que poderiam ativar essa fobia são relacionados à exposição de situações ou pessoas que aumentem a probabilidade de contrair o vírus (como sair de casa, ir trabalhar, encontrar pessoas, etc) e informações ou pensamentos sobre doenças infecciosas. Os trabalhos chegam a citar uma nova escala criada para avaliar seus sintomas: a Coronavirus Anxiety Scale.
Em relação à sua manifestação, podemos destacar 3 componentes principais ligados ao medo:
Obviamente o vírus está relacionado a problemas de saúde reais, sendo necessário seguir as medidas de segurança e orientações cabíveis dos respectivos órgãos de referência. Contudo, o que se discute aqui é como as alterações decorrentes desta situação podem comprometer o funcionamento da vida diária.
Agora vamos destacar os fatores de risco associados a esta condição, bem como aspectos relacionados ao desenvolvimento do quadro:
No que diz respeito ao impacto dessa situação, outro estudo buscou avaliar o quanto a “coronofobia” seria capaz de explicar o sofrimento psicológico vivido durante a pandemia de Covid-19. Através de uma análise de regressão múltipla hierarquizada, demonstrou-se que a “coronofobia” explicou variações adicionais em quadros de depressão, ansiedade generalizada e ansiedade por medo da morte.
Também concluíram que os fatores relacionados à vulnerabilidade (neuroticismo, ansiedade relacionada à saúde e comportamentos que procurem reasseguramento) afetariam negativamente o bem-estar emocional durante a pandemia. Dentro desses sintomas, a presença de comportamentos de reasseguramento parece estar fortemente ligada à ansiedade sobre a saúde e “coronofobia”. Os autores validaram que pessoas com muita ansiedade relacionada a doenças infecciosas procuram repetidamente reassegurar-se de que não estão doentes durante a pandemia.
Outra consequência observada diz respeito a uma relutância dos pacientes a procurarem serviços de saúde para diagnóstico e tratamento de questões habituais, assim como apreensão ao retorno às atividades cotidianas.
Ainda é necessário considerar fazer um paralelo entre esta situação e o transtorno de ajustamento (ou adaptação), já discutido aqui no Portal). Este refere-se a uma resposta a estressores não necessariamente traumáticos (podem envolver mudanças, alterações no ambiente de trabalho, em resposta ao diagnóstico de uma doença, etc) associada a sofrimento muitas vezes desproporcional ao evento desencadeante. Apesar de ainda haver poucos estudos sobre este transtorno, sua frequência parece ser relevante.
No geral os autores ressaltam que são necessárias mais pesquisas. Trabalhos com terapia cognitivo-comportamental oferecida através da internet já estão sendo realizados para avaliar a resposta dos pacientes com esta alteração. É possível que os resultados sejam publicados em breve.
Autor(a):Paula Benevenuto Hartmann
Psiquiatra pela UFF ⦁ Graduação em Medicina pela UFF
Referências bibliográficas:
PRAZO CURTO