Quinta-feira, 21 de novembro de 2024 Login
Engana-se quem pensa que a telemedicina é um tema novo. Há registros de seu uso no combate à peste negra e no atendimento aos soldados feridos durante a Primeira e a Segunda Guerra Mundial.
Outra curiosidade é que o estabelecimento do seu pilar regulatório data dos anos 1990, com a “Declaração de Tel Aviv sobre responsabilidades e normas éticas na utilização da Telemedicina” (adotada pela 51ª Assembleia Geral da Associação Médica Mundial, em Tel Aviv/Israel, em outubro de 1999).
Segundo o estudo Global Summit Telemedicine & Digital Health 2020, realizado pela Associação Paulista de Medicina (APM), com 2.258 médicos brasileiros, de 55 especialidades, antes mesmo da pandemia, 65,19% deles já utilizavam aplicativos de mensagens para interagir com seus pacientes fora das clínicas e hospitais.
Contudo, é inegável que a eclosão da pandemia da covid-19 mexeu substancialmente com as estruturas do atendimento em saúde em todo o mundo. E no Brasil não foi diferente. Para assegurar o atendimento à população mesmo com o avanço do novo coronavírus, recursos digitais, como a telemedicina foram adotados por operadoras de saúde, médicos particulares e até serviços públicos, mesmo ainda com doses de desconfiança e insegurança em relação ao serviço à distância.
De acordo com uma pesquisa publicada na revista científica Plos One, em julho de 2021, somente aqui no Brasil, houve um aumento de mais de 800% no uso da telemedicina nos seis primeiros dias da pandemia.
Na opinião dos autores, a telemedicina apresenta uma abordagem eficaz para apoiar profissionais clínicos baseados em locais remotos para gerenciar pacientes com a covid-19 em um cenário com grandes disparidades regionais no acesso aos serviços de saúde e distribuição desigual de médicos, o que constitui um desafio considerável para atender às necessidades de diagnóstico e tratamento durante a pandemia.
Um exemplo apresentado no artigo foi o Amapá, que é um estado de baixa renda (pelo PIB per capita), tem 0,44 médicos por 1.000 habitantes, enquanto o Espírito Santo possui 10,41 médicos.
Além disso, foi ressaltado que os profissionais de saúde que atendem em municípios remotos apresentam alta rotatividade de pacientes, sem esquecer ainda da falta de especialistas, que inviabiliza encaminhamentos e consultas de casos fora do padrão.
Tendência mundial
Segundo especialistas brasileiros, o país apenas seguiu uma tendência que foi colocada em prática em quase todo o mundo globalizado e que ajudou a alavancar o uso da tecnologia no setor.
“Na pandemia, a consulta por vídeo é um instrumento muito importante para que o médico continue acompanhando seus pacientes e atenda a novas situações clínicas sem que os pacientes precisem se deslocar e ter contato com outras pessoas. Para o paciente, reduz o risco de contaminação. Para os médicos, a teleconsulta propicia um melhor controle de sua agenda e também menor deslocamento”, disse o médico cirurgião Ricardo Salem, diretor de saúde da operadora Care Plus, em entrevista ao Portal PEBMED.
Ele ainda complementou que apesar de uma menor interação entre médico e paciente, devemos contextualizar o cenário das teleconsultas com o conceito de “work from anywhere”, com uma grande quantidade de pessoas morando longe de onde habitualmente reside, e a telemedicina permitindo a continuidade da relação médico-paciente.
“Outra grande vantagem é o acesso: a telemedicina permite que uma pessoa, em qualquer local do Brasil, tenha acesso aos profissionais mais capacitados para sua condição clínica”, destacou Ricardo Salem.
Pico de atendimento em 2021
O Centro de Saúde Rita Saúde foi lançado em março de 2021, dentro do cenário pandêmico. Nos momentos de pico dos casos, os atendimentos aumentaram em torno de 60% para as consultas não programadas.
“A diferença de outros serviços está na garantia de acesso, ou seja, como nossas consultas programadas são regulares e o paciente sabe que será atendido pela equipe que já o conhece, o acionamento não funciona como de um pronto-socorro digital, por exemplo. Já na Amparo Saúde, entre março de 2020 até os dias atuais o número de consultas aumentou 9,5 vezes”, contou o médico de família e especialista em gestão de sistemas de saúde, Fernando Uzuelli, Head do Rita Saúde, em entrevista ao Portal PEBMED.
Os pacientes atendidos hoje no Centro de Saúde Digital do Rita contam com uma equipe de enfermeiros e médicos que, de maneira longitudinal, promove atendimentos em regime de consultas programadas, previamente agendadas, e não programadas, que são atendimentos para demandas agudas em regime de 24 horas, sete dias por semana, mas que não podem esperar a próxima consulta.
“Não somos um serviço de tele urgência, por isso orientamos nossos pacientes em casos de maior gravidade a procurar o serviço de emergência de referência a que eles têm cobertura”, ressaltou Fernando Uzuelli.
No Hospital São Vicente de Paulo, a procura pelo serviço online também aumentou bastante, como explicou melhor a médica clínica Ana Cecilia Zaroni, plantonista do CTI e membro da chefia de clínica médica do HSVP, em entrevista ao Portal PEBMED.
“A procura aumentou bastante, o que fez com que aprendêssemos uma nova ferramenta importante nos dias de afastamento, o que auxiliou muitos que, por medo de sair de casa, não postergaram o tratamento de suas questões médicas. Aqui no HSVP, entre o segundo semestre de 2020 e o primeiro de 2021, registramos um aumento de 300% das teleconsultas”, constatou Ana Zaroni.
Para a especialista, a telemedicina, assim como a avalanche tecnológica em que vivemos, tem seu espaço e não pode ser bloqueada, pois faz parte de uma evolução da sociedade mundial. Os médicos e demais profissionais de saúde devem usá-la de forma positiva, sempre avaliando caso a caso.
“Somando a inteligência artificial e o nosso julgamento e discernimento, só temos a ganhar”, acrescentou a médica plantonista do CTI do HSVP.
Rumos da telemedicina no Brasil
É indiscutível que graças à telemedicina, grandes conquistas foram possíveis, como orientar cirurgias e até realizar determinados procedimentos à distância. Sendo possível examinar pacientes, levando atendimento profissional especializado ou, às vezes, até super especializado para áreas remotas, em que não haveria tal possibilidade sem que esse paciente tivesse que se deslocar até grandes centros.
Claro que é consenso que medicina é uma profissão que se caracteriza por uma relação interpessoal e a consulta presencial é muito mais completa e segura. Então, a meta é que a consulta à distância tenha a mesma segurança que a presencial.
Mesmo tendo sido incorporada no dia a dia da prática médica, a telemedicina continua a ser regulamentada em caráter provisório aqui no Brasil, sendo seu exercício autorizado em caráter excepcional e provisório durante o estado de emergência de saúde pública decorrente da pandemia de Covid-19. Sendo assim, especialistas da área de saúde temem que encerrada a pandemia, retornaremos ao cenário anterior, de regulamentação restritiva e vias incertas.
Por isso, autoridades, comunidade médica, além de profissionais do mercado de assistência à saúde já discutem a regulamentação da telemedicina dentro de um mundo pós-pandemia. Os debates têm sido travados no âmbito do Conselho Federal de Medicina e do Congresso Nacional.
E embora os benefícios da telemedicina tenham sido muito bem-vindos durante a pandemia, não existe consenso sobre alguns pontos críticos: como a obrigatoriedade ou não de uma primeira consulta presencial para permitir o exame físico do paciente, a necessidade de inscrição do médico nos Conselhos Regionais de Medicina de todos os estados aos quais prestaria serviços remotos e a possibilidade irrestrita ou condicionada de utilização da telemedicina nas diversas áreas médicas.
Em resumo: a pandemia da covid-19 deixou claro que a telemedicina é um instrumento importante e efetivo para ampliação do acesso à saúde em todo o território brasileiro. Resta que ele seja reconhecido por uma regulamentação sólida, conferindo segurança jurídica ao seu pleno exercício da profissão médica.
*Esse artigo foi revisado pela equipe médica da PEBMED.
Autora: Úrsula Neves
Jornalista formada pela Universidade Estácio de Sá (UNESA), pós-graduada em Comunicação com o Mercado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e em Gestão Estratégica da Comunicação pelo Instituto de Gestão e Comunicação (IGEC/FACHA)
Fotos: divulgação
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