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Em compensação, desejo de engravidar caiu de 32,7% para 5,1%

Foto: Divulgação

Estudo revela aumento da frequência sexual das mulheres durante a pandemia

Publicado em 03/11/2020 às 11:00

Não há como negar: a Covid-19 mexeu profundamente com a vida de todos nós. A repercussão disso sobre a vida sexual feminina merece consideração e será abordada a partir da discussão feita no estudo Effect of the Covid-19 pandemic on female sexual behavior publicado há pouco tempo no International Journal of Gynecology and Obstetrics. Ao fazer comparações com trabalhos anteriores, este estudo avaliou alguns aspectos da sexualidade feminina durante períodos de guerra ou de desastres naturais e, em suas próprias conclusões, reflete sobre mudanças que podem ser observadas no curso da pandemia.

Características do estudo

Para entender como o novo coronavírus afetou o comportamento sexual das mulheres, a pesquisa foi dividida em 2 etapas. Na primeira etapa, os pesquisadores utilizaram dados de 2 estudos sobre incontinência urinária que já estavam sendo feitos (e que ainda não foram publicados) com pacientes atendidas no ambulatório de urologia e ginecologia entre fevereiro de 2018 e setembro de 2019. Na segunda etapa, uma parte das mesmas mulheres da primeira amostra foi ouvida. Elas foram abordadas este ano (entre março e abril de 2020), por telefone, por causa das limitações e restrições relacionadas à pandemia. É possível que a coleta de informações por telefone na segunda parte do estudo tenha influenciado a resposta das participantes, devendo isso ser levado em consideração.

Graças aos registros dos primeiros trabalhos foi possível obter história médica detalhada de cada paciente, o que inclui a idade, o índice de massa corporal (IMC), o grau de escolaridade, o nível de renda, a presença de comorbidades, o número de partos, informações sobre a menstruação, frequência da atividade sexual e desejo de engravidar. Elas também deveriam preencher o Female Sexual Function Index (FSFI), um questionário de 19 questões em que se avalia o funcionamento sexual feminino.

Foram, então, comparados os dados registrados na primeira parte (entre 6 e 12 meses antes da pandemia) com as informações colhidas na segunda parte, entre março e abril de 2020. Os tópicos avaliados foram: frequência das relações sexuais, o desejo de engravidar, o FSFI, o tipo de contraceptivo que usavam e a presença de infecção vaginal.

A amostra foi composta por apenas 58 mulheres com mais de 18 anos e que não estivessem na menopausa. Foram excluídas as pacientes com história de incontinência urinária, cirurgia pélvica ou ginecológica, prolapso de órgão pélvico, malignidade, doença neurológica ou psiquiátrica, radiação pélvica, doença cardíaca, insuficiência renal, hepatite B ou C, infecção por HIV, aquelas que relataram problemas conjugais, com teste positivo para Covid-19 ou que moravam com alguém que tivesse testado positivo para a doença ou com pessoa suspeita de tê-la contraído.

Limitações

O fato de a amostra ser pequena (apenas 58 participantes) poderia ser compreendido como uma limitação, apesar de análises terem sido feitas para se chegar a esse número mínimo de participantes de forma a tornar a análise significativa. A média de idade das participantes era de 27,6 anos e o IMC de 27,9. Já a idade média da menarca foi de 11,9 anos e da sexarca de 21,1 anos.

Vamos considerar o que a literatura diz e o que os autores deste estudo encontraram em cada um dos tópicos avaliados:

  • Estresse: a literatura revela que eventos estressantes impactam sobre o desejo sexual feminino e a frequência de relações, apesar de algumas controvérsias. Enquanto alguns trabalhos encontraram que a presença de estresse crônico ou desastre natural levou a uma diminuição do desejo sexual e da frequência de relações, outros relataram aumento da atividade sexual feminina em momentos de mais estresse. Neste trabalho os autores descobriram que houve aumento do desejo sexual e da frequência de relação sexual durante a pandemia. Eles atribuem isso a duas razões principais: as pessoas ficaram mais tempo em casa e seus locais de moradia permaneceram preservados (diferentes de situações de catástrofes naturais ou guerra).
  • Disfunção sexual feminina: avaliações anteriores também pontuam que desastres naturais e guerras podem ter efeito negativo sobre a disfunção sexual feminina, mensurada com o uso do FSFI. Os achados do presente estudo são compatíveis com essa literatura, pois observou-se uma deterioração importante da função sexual feminina durante a pandemia por Covid-19.
  • Medidas contraceptivas e gestação: estudos anteriores também encontraram que muitas mulheres negligenciaram medidas contraceptivas após desastres naturais. Em alguns casos isso ocorreu devido às dificuldades de acesso a esses meios. No presente estudo observou-se uma diminuição significativa na quantidade de mulheres que pretendiam engravidar durante a pandemia. É possível que isso se deva ao fato de ainda não se saber qual o efeito do vírus sobre o desenvolvimento fetal, o medo de que o acesso ao sistema de saúde seja mais difícil e devido às preocupações econômicas. Contudo, é curiosa a constatação de que medidas contraceptivas tenham sido significativamente reduzidas neste momento.
  • Ciclo menstrual: a literatura também descreve os efeitos negativos de desastres sobre a regularidade do ciclo menstrual. De maneira coincidente com esses relatos, o presente trabalho permitiu avaliar que as anormalidades menstruais também aumentaram significativamente durante a pandemia.
  • Infecção: trabalhos anteriores também mostraram que desastres de larga escala aumentam as taxas de infecções vaginais por diminuição da higiene pessoal, dificuldade de acessar serviços de saúde e condições pouco higiênicas. De forma discordante com a literatura, neste trabalho não se verificou um aumento das taxas de infecções vaginais. Especula-se que a obrigação de ficar em casa e a ênfase contínua da mídia sobre a necessidade de lavagem de partes do corpo para conter a infecção possam ter contribuído para isso.

Conclusão

Resumindo, neste trabalho observou-se que houve um aumento da frequência de relações sexuais durante a pandemia de Covid-19 em comparação com o período que a antecedeu. Em compensação, se antes da pandemia 32,7% das mulheres avaliadas tinham o desejo de engravidar, após, esse número caiu para 5,1%. Curiosamente, o uso de métodos contraceptivos diminuiu significativamente. Também foi observado um aumento de alterações relacionadas à menstruação.

De forma complementar, os resultados do questionário FSFI foram melhores antes da pandemia do que durante a mesma. Dentro dos domínios avaliados por essa escala, apenas o desejo sexual aumentou com a pandemia de Covid-19, enquanto 3 outros domínios importantes (excitação, orgasmo e satisfação) foram maiores antes da pandemia. A partir disso, os autores concluíram que apesar de a frequência sexual ter aumentado durante a pandemia, a qualidade da vida sexual dessas mulheres diminuiu.

Finalmente, devemos considerar a necessária cautela ao extrapolar essas conclusões para outras realidades por diversos fatores, apesar de eles poderem indicar algumas alterações que já podem estar ocorrendo na vida sexual das mulheres ao longo deste ano marcado pela Covid-19. Também devemos avaliar que este estudo manteve seu foco apenas sobre o comportamento sexual feminino. No entanto, o comportamento sexual masculino também foi afetado pela pandemia de Covid-19, o que também pode impactar sobre as atitudes femininas.

Fonte: PEBMED

Autor(a): Paula Benevenuto Hartmann

Psiquiatra pela UFF ⦁ Graduação em Medicina pela UFF

Referências bibliográficas:

  • Yuksel B, Ozgor F. Effect of the COVID‐19 pandemic on female sexual behavior. International Journal of Gynecology and Obstetrics. 2020 May. doi: 1002/ijgo.13193
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