Quarta-feira, 13 de novembro de 2024 Login
O físico e astrônomo carioca Marcelo Gleiser, anunciado como o grande vencedor do Prêmio Templeton 2019 nesta terça-feira (19), não faz o tipo introspectivo que o estereótipo de cientistas poderia ter. Ao contrário: gosta de se expressar, é frequentemente chamado para dar palestras para diferentes audiências e, com mais de 100 artigos acadêmicos publicados, ele também é best-seller com livros que tratam a ciência de uma forma mais abrangente e reflexiva, voltado para o público em geral.
Enquanto na obra acadêmica Gleiser se debruça sobre números, gráficos e tabelas em busca de pistas que ajudem a desvendar a formação do universo, na atuação pública ele expande a interpretação das tais evidências em busca da resposta à grande questão da humanidade: Afinal, quem somos?
No mesmo dia em que completa 60 anos de idade, Gleiser foi anunciado como o vencedor do prêmio que reconhece a contribuição de personalidades para grandes questões da humanidade. O valor pago é de R$ 5,5 milhões. A cerimônia de premiação será em 29 de maio, em Nova York.
Em entrevista ao G1, direto de New Hampshire, nos EUA, onde se dividia entre as ligações de jornalistas e familiares que queriam cumprimentá-lo pelo aniversário, Gleiser comentou o prêmio Templeton, sua obra acadêmica e literária e a visão de mundo que tenta responder quem somos nós no universo.
Ciência para compreender o mistério
"A ciência é o caminho para entendermos o mistério da existência humana", diz Marcelo Gleiser, que atua na área da cosmologia, que une física e astronomia para estudar as origens e propriedades do universo. "É mais ou menos o que o paleontólogo faz: a partir de ossos de dinossauro, reconstrói o passado. Buscamos pistas no universo para reconstruir a história desde o Big Bang até hoje", explica.
Para ele, ciência e espiritualidade são dois lados de uma moeda só. “A ciência é a nossa metodologia mais poderosa para compreender o mundo natural. Mas, por outro lado, a ciência tem limite e oferece só um tipo de explicação”, diz.
"A gente sabe que só vê parte da realidade. Essa conexão com o mistério que nos cerca, para mim, é profundamente espiritual. Meu discurso tem todo um lado ecológico e social. Informa pela ciência, mas constrói uma nova moral do século 21 para salvar nosso planeta e nossa espécie", diz.
Ele não está sozinho. Grandes cientistas também se dedicaram ao deslumbramento filosófico da vida e da humanidade.
No livro ‘Quantum questions: Mystical Writing of the World's Greatest Physicists’ (‘Perguntas quânticas: escritos místicos dos maiores físicos’, sem tradução para o português), Albert Einstein descreve no artigo ‘Cosmic Religious Feelling’ (Sentimento religioso cósmico) as suas reflexões sobre a existência humana no universo.
Gleiser diz que se identifica com Einstein. “Eu me identifico muito com o que Einstein chama de ‘mistério cósmico religioso’. Essa urgência que temos de nos conectar. Isso é uma coisa que eu tenho, desde antes de ser cientista. Sou carioca, cresci indo da praia para as montanhas, vendo o céu estrelado. Dentro da ciência, em raros momentos da vida profissional você faz uma descoberta e, quando vê alguma coisa acontecendo na sua frente, você sente um frio no estômago. Você diz: 'Caramba, eu consegui vislumbrar uma coisa que nem todo mundo conseguiu. Uau.' É um momento que acontece, através da ciência mais racional, mas que leva para este sentimento", explica ele, que se declara agnóstico, e não ateu, porque “não posso dizer que não acredito naquilo que não sei se existe”.
Para ele, a visão que ele emprega sobre a ciência também pode ser adotada em outras áreas, incluindo a economia e a gestão de pessoas.
“No meu último livro ['A simples beleza do inesperado’, Ed. Saraiva] eu mostro como nosso planeta e nossa espécie é rara. Meu discurso tem todo um lado ecológico e social. Informa pela ciência, mas constrói uma nova moral do século 21 para salvar nosso planeta e nossa espécie”, diz.
Em 1998, Gleiser ganhou o prêmio Jabuti com a publicação ‘Dança do Universo’ e, em 2002, foi novamente premiado com o livro ‘O fim da Terra e do Céu’.
Em 2006, ele apresentou a série de 12 episódios 'Poeira das Estrelas', no Fantástico.
Gleiser fundou em 2016 o ICE (Instituto de Engajamento à Interdisciplinariedade) em Dartmouth, com a ideia de promover o diálogo construtivo entre as ciências naturais e humanas, seja na esfera pública ou acadêmicas. O instituto tem apoio da fundação John Templeton.
Prêmio Templeton
O prêmio Templeton foi criado para "servir como um catalisador filantrópico para descobertas relacionadas às questões mais profundas que a humanidade enfrenta", de acordo com a instituição. A Fundação apoia pesquisas que vão desde a complexidade, evolução e emergência até a criatividade, perdão e livre-arbítrio.
De acordo com a fundação responsável pelo prêmio, Gleiser foi o escolhido pelo conjunto do seu trabalho que, ao longo dos anos, evoluiu para a quebra de simetria, transições de fase e estabilidade de sistemas físicos, conceitos que influenciaram sua crítica às "teorias de tudo".
"O prêmio celebra o trabalho de muitos indivíduos maravilhosos, incluindo alguns dos grandes físicos e cientistas de nosso tempo, cujas pesquisas exploraram questões de significado e valor além dos limites tradicionais de suas disciplinas. Pensar que um dia eu seria incluído em um grupo distinto, sendo um imigrante do Brasil, é inacreditável ", disse Gleiser no site do Dartmouth College.
Além de Gleiser, a fundação já premiou 48 pessoas desde que foi criada em 1972. Entre eles estão Madre Teresa (1973), Dalai Lama (2012) e o Arcebispo Desmond Tutu (2013).
"Eu me sinto profundamente honrado em fazer parte deste grupo especial de pessoas, tanto líderes religiosos quanto cientistas", diz.
Fonte: /g1.globo.com
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